Cabo espichel

Num dos muitos passeios que fiz até ao Cabo Espichel, descobri juntamente com um amigo uma construção que se tornou um miradouro. Permanece na ponta de uma das arribas do Cabo, mas a magia deste sítio não são apenas as vistas incríveis, mas também as próprias paredes que servem de tela a pinturas que se vão renovando. Sempre que lá vou procuro as que ainda não vi, as mais frescas, e tento enquadrá-las num cenário que construo involuntariamente. Tento imaginar quem seriam os autores, no que estariam a pensar quando deram as primeiras pinceladas, com quem estavam, qual a hora do dia. Sempre que lá vou, há detalhes que ficaram por observar, há novas interpretações. Aquelas telas acompanham o tempo e as vontades, não exigem regras nem limites à imaginação ou à liberdade de expressão. São telas vivas, que albergam olhares distintos do mundo, sem requisitos, mas cujos olhares vão sendo analisados e eles próprios criticados e alterados. Um espaço comum em que toda a gente tem direito a estar e a ter uma voz, ainda que fique a seu critério se essa voz terá nome. Sítios abandonados têm uma beleza única no seu misticismo, na sua história contada por cicatrizes que ficam e permanecem para levantar a ponta do véu de narrativas entranhadas. São lugares que foram outros lugares e deixam de o ser, dando espaço à imaginação da interpretação de cada detalhe.  

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